Pensar A Direito | Mas afinal o que é uma profissão de desgaste rápido?

Nos últimos anos têm existido várias petições no sentido de considerar determinadas profissões como “profissões de desgaste rápido”, desde a profissão de enfermeiro até à de motorista de veículos pesados.

Ora, sendo Portugal um país que muito gosta de legislar, é com alguma admiração (ou nenhuma) que nos deparamos com grandes lacunas nesta matéria.

Vejamos.

A designação de ‘profissão de desgaste rápido’ aparece-nos, desde logo, no Código de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (CIRS), mais concretamente, nas epígrafes dos artigos 27.º e 32.º-A, sendo que o n.º 2 do artigo 27.º estipula que “(…) consideram-se profissões de desgaste rápido as de praticantes desportivos, definidos como tal no competente diploma regulamentar, as de mineiros e as de pescadores”. Na verdade, esta disposição apenas elenca algumas (poucas!) profissões de desgaste rápido, mantendo por esclarecer as características ou condições necessárias subjacentes a esta classificação.

Já se analisarmos o Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, que define e regulamenta o regime de proteção nas eventualidades invalidez e velhice dos beneficiários do regime geral de segurança social, verificamos que o artigo 20.º, n.º 1, alínea c) consagra a possibilidade de antecipação da idade de pensão de velhice, por motivo da natureza especialmente penosa ou desgastante da atividade profissional exercida, expressamente reconhecida por lei. Aqui, o legislador não refere ‘profissão de desgaste rápido’, mas sim ‘atividade profissional de natureza penosa ou desgastante’, contudo parece-nos apenas um mero desleixo e não uma diferenciação propositada.

Mas, afinal, que critérios poderiam indicar-nos o que é ou não uma profissão de desgaste rápido?

Nesta matéria, é habitual, identificarem-se três critérios: (i) pressão e stress; (ii) desgaste emocional e físico; e (iii) condições de trabalho. Parece-nos que a verificação do primeiro e segundo critérios não permita, só por si, classificar determinada profissão como de desgaste rápido. Na verdade, são critérios que apesar de poderem ser observados de forma objetiva em relação a cada profissão, têm também uma vertente subjetiva. Assim, parece-nos essencial, a conjugação destes critérios com o último critério, relativo às condições de trabalho. As condições de trabalho prendem-se, nomeadamente com o horário do trabalhador (por exemplo, se realiza turnos ou presta trabalho noturno); com as condições de saúde e higiene; condições de segurança, entre outras. Apesar de admitimos que possam ser critérios válidos, falta-nos uma definição mais rigorosa de cada um deles, assim como uma definição para “profissão de desgaste rápido”.

E a qualificação de determinada profissão como profissão de desgaste rápido, teria apenas como direitos a possibilidade de antecipação da idade de pensão de velhice e um regime fiscal um pouco mais favorável?

Ora, almejamos que assim não seja. Na verdade, nesta matéria poderá discutir-se a consagração de outros benefícios, e.g. a possibilidade de existirem consultas médicas anuais, de forma a avaliar a saúde física e mental do trabalhador, com o objetivo de detetar eventuais situações em que seja necessário acompanhamento médico regular ou de incapacidade e a adoção de medidas que incentivem a reconversão profissional do trabalhador.

Assim, aguardamos que o relatório a elaborar pelo grupo de trabalho já (supostamente) constituído no âmbito das áreas governativas do trabalho e da segurança social para o estudo das profissões de desgaste rápido, risco e penosidade, elucide o nosso legislador nesta matéria.

 

Sara Aires

Filomena Girão

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