Como já foi abordado noutra edição da rubrica Fique Atento, no passado mês de novembro a Assembleia da República aprovou várias alterações em matéria laboral, alterações essas que aguardavam a devida promulgação.
Assim, no passado dia 06 de dezembro foi publicada a Lei n.º 83/2021, que veio modificar o regime jurídico de teletrabalho, procedendo a alterações ao Código do Trabalho e à Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Da recém-publicada lei destacamos as seguintes alterações:
-» Exigência de forma escrita
A implementação do regime de teletrabalho depende sempre de acordo escrito, que pode constar do contrato de trabalho inicial ou ser autónomo em relação a este.
-» Duração e cessação do acordo de teletrabalho
O acordo escrito de teletrabalho pode ser celebrado com duração determinada (até 6 meses, renováveis, salvo se alguma das partes se opuser à renovação por escrito até 15 dias antes do seu término) ou indeterminada (podendo, neste caso, ser denunciado com um aviso prévio de 60 dias, por qualquer uma das partes). Adicionalmente, qualquer das partes pode denunciar o acordo durante os primeiros 30 dias da sua execução.
-» Trabalhadores que têm direito a requerer o regime de teletrabalho
O novo diploma prevê um alargamento da possibilidade de os trabalhadores requerem o exercício de funções em regime de teletrabalho, desde que o regime de teletrabalho seja compatível com a atividade desempenhada e a entidade empregadora disponha de recursos e meios para o efeito quando:
a) tenham filho(s) até aos 3 anos de idade;
b) tenham filho(s) até aos 8 anos de idade nas seguintes situações:
• Nos casos em que ambos os progenitores reúnem condições para o exercício da atividade em regime de teletrabalho, desde que este seja exercido por ambos em períodos sucessivos de igual duração num prazo de referência máxima de 12 meses;
• Nas situações em que apenas um dos progenitores tem possibilidade de realização das suas funções em teletrabalho;
• Famílias monoparentais em que o progenitor tem possibilidade de realização das suas funções em teletrabalho.
Nota: este direito não é aplicável ao trabalhador de microempresa.
c) Sejam cuidadores informais não principais, pelo período máximo de 4 anos seguidos ou interpolados.
-» Organização, direção e controlo do trabalho
• O controlo da prestação de trabalho, por parte do empregador, deve respeitar os princípios da proporcionalidade e da transparência, sendo proibido impor a conexão permanente, durante a jornada de trabalho, por meio de imagem ou som;
• As reuniões de trabalho à distância, assim como tarefas que devem ser realizadas em tempos precisos e em articulação com outros trabalhadores, devem ser agendadas preferencialmente com 24 horas de antecedência e ter lugar dentro do horário de trabalho;
• O trabalhador é obrigado a comparecer nas instalações da empresa (ou noutro local designado pelo empregador), para reuniões, ações de formação e outras situações que exijam a presença física, quando tenha sido convocado com, pelo menos, 24 horas de antecedência. Neste caso, o empregador suporta o custo das deslocações na parte em que exceda o custo normal do transporte entre o domicílio do trabalhador e local em que normalmente prestaria trabalho em regime presencial.
-» Privacidade do trabalhador em regime de teletrabalho
• Quando o teletrabalho seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita ao local de trabalho requer aviso prévio de 24 horas e concordância do trabalhador;
• A visita só deve ter por objeto o controlo da atividade laboral, bem como dos instrumentos de trabalho e apenas pode ser efetuada na presença do trabalhador durante o horário de trabalho acordado;
• No acesso ao domicílio do trabalhador, as ações integrados pelo empregador devem ser adequadas e proporcionais aos objetivos e finalidades da visita, sendo vedada a captura e utilização de imagem, de som, de escrita, de histórico ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do trabalhador.
-» Distribuição de informação sindical
As estruturas representativas dos trabalhadores têm o direito proceder à distribuição de convocatórias, comunicações, informações ou outros textos relativos à vida sindical e aos interesses socioprofissionais dos trabalhadores, por via de lista de distribuição de correio eletrónico para todos os trabalhadores em regime de teletrabalho, disponibilizado pelo empregador.
-» Equipamentos e sistemas necessários à prestação de trabalho
• O empregador é responsável pela disponibilização ao trabalhador dos equipamentos e sistemas necessários à prestação de trabalho e à interação trabalhador-empregador, devendo o acordo especificar se são fornecidos diretamente ou adquiridos pelo trabalhador, com a concordância do empregador. Sendo fornecidos pelo empregador, as condições para o seu uso para além das necessidades do serviço são as estabelecidas pelo regulamento interno ou, caso não exista, estas são definidas pelo acordo (que estipula o regime de teletrabalho);
• São integralmente compensadas pelo empregador todas as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte com a aquisição ou uso dos equipamentos e sistemas informáticos ou telemáticos, incluindo os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidade de comunicação de serviço, assim como os custos de manutenção.
Nota: são consideradas despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo, assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no mesmo mês do último ano anterior à aplicação desse acordo.
-» Deveres especiais do empregador
• Informar o trabalhador, quando necessário, acerca das características e do modo de utilização de todos os dispositivos, programas e sistemas adotados para acompanhar à distância a sua atividade;
• O empregador deve abster-se de contactar o trabalhador no período de descanso, exceto em situações de força maior;
• Diligenciar no sentido da redução do isolamento do trabalhador, promovendo contactos presenciais entre os trabalhadores em regime de teletrabalho e a(s) chefia(s), com a periodicidade estabelecida no acordo de teletrabalho ou, sem caso de omissão, com intervalos não superiores a 2 meses;
• Garantir ou custear as ações de manutenção e de correção de avarias do equipamento e dos sistemas utilizados no teletrabalho, independentemente da sua propriedade;
• Consultar o trabalhador, por escrito, antes de introduzir mudanças nos equipamentos e sistemas utilizados na prestação de trabalho, nas funções atribuídas ou em qualquer característica da atividade contratada;
• Facultar ao trabalhador formação adequada para o uso adequado e produtivo dos equipamentos e sistemas que serão utilizados no regime de teletrabalho.
-» Deveres do trabalhador
• Informar atempadamente o empregador de quaisquer avarias ou defeitos de funcionamento dos equipamentos e sistemas utilizados;
• Cumprir as instruções do empregador relativas à segurança da informação utilizada ou produzida no desenvolvimento da atividade contratada;
• Respeitar e observar as restrições e os condicionamentos que o empregador defina no tocante ao uso para fins pessoais dos equipamentos e sistemas de trabalho fornecidos ao trabalhador;
• Observar as diretrizes do empregador em matéria de saúde e segurança no trabalho.
-» Segurança e saúde no trabalho
• É vedada a prática de teletrabalho em atividades que impliquem o uso ou contacto com substâncias e materiais perigosos para a saúde ou a integridade física do trabalhador, exceto se efetuados em instalações certificadas para o efeito;
• Antes da implementação do teletrabalho, o empregador deverá promover a realização de exames de saúde e, posteriormente, exames anuais para avaliação da aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício da atividade, a repercussão desta e das condições em que é prestada na sua saúde, assim como as medidas preventivas que se mostrem adequadas;
• O trabalhador deverá facultar aos profissionais designados pelo empregador, em período previamente acordado (entre as 09H e as 19H), o acesso ao local onde presta trabalho, tendo estes a seu cargo a avaliação e o controlo das condições de segurança e saúde no trabalho;
• O regime legal de reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais aplica-se às situações de teletrabalho, considerando-se local de trabalho o local escolhido pelo trabalhador para exercer habitualmente a sua atividade e tempo de trabalho todo aquele em que, comprovadamente, esteja a prestar o seu trabalho ao empregador.
Para além destas alterações introduzidas em matéria de teletrabalho, foi aditado ao Código de Trabalho o artigo 199.º-A, que consagra o dever de abstenção de contacto, de acordo com o qual o empregador fica impedido de contactar o trabalhador fora do horário de trabalho, exceto em situações de força maior.
Este novo regime de teletrabalho entrará em vigor a 01 de janeiro de 2022.
Fique Atento!