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Pensar A Direito | Confissões redentoras

Pensar A Direito | Confissões redentoras

Inúmeras são as notícias que versam sobre abuso sexual e casos de pedofilia na Igreja Católica. Também já o Presidente da República se pronunciou sobre o assunto, fazendo o (menos feliz) comentário que já todos conhecemos. A 17 de outubro, seis de dez inquéritos instaurados por abuso de menores conheceram despacho de arquivamento.

Urge assim dar palco a este assunto e analisar o próprio funcionamento da Igreja.

Sabendo que o abuso sexual de crianças é um crime de natureza pública, punível pelo artigo 171.º do Código Penal com pena de prisão, levanta-se a questão: estará o padre sujeito a sigilo no caso de ter conhecimento, em confissão do perpetrador, da vítima ou de um terceiro, da prática de um crime de abuso sexual cometido contra um menor?

Segundo o artigo 242.º do Código de Processo Penal, só os funcionários, na aceção do artigo 386.º do Código Penal, estão obrigados a denunciar os crimes de que tomem conhecimento no exercício das suas funções.

O Cânone 983 §1 do Código de Direito Canónico estabelece que o confessor não pode denunciar o penitente “nem por palavras, nem por qualquer outro modo, nem por causa alguma”. O sacerdote que violar este sigilo é automaticamente penalizado com a excomunhão. Vozes afirmam que esta insistência na inviolabilidade do segredo da confissão se trata de uma demonstração de que a Igreja não coloca o bem estar e a segurança das crianças em primeiro lugar.

Uma das particularidades mais apelativas da confissão é, certamente, o seu carácter anónimo; o que explica que se digam certas coisas, versando sobre crimes ou não, que provavelmente não seriam pronunciadas em voz alta em qualquer outra circunstância. Para a vítima, a confissão poderá configurar uma forma de falar sobre o assunto sem demonstrar a sua identidade e sofrer represálias por isso, como a vitimização secundária que acontece muitas vezes ao fazer-se queixa destes abusos – o tal “de certeza que não estavas a pedi-las?”. Na verdade, quanto a esta questão poder-se-iam levantar outras – nomeadamente, o que leva a que uma vítima se sinta mais segura em partilhar com um pároco confessor do que com um agente de autoridade com competência para dar início a um processo de investigação – que não serão abordadas de momento. Ainda assim, aceita-se que para os crentes a possibilidade de obter redenção pelos seus pecados, de forma anónima e sigilosa, poderá ser uma mais-valia.

Mas não poderá este ser o caminho para que um perpetrador, que confesse a prática de um crime, se sinta redimido sem enfrentar quaisquer consequências, podendo até continuar a prática de crimes? Se Deus até lhe oferece absolvição, qual o motivo para não voltar a praticar o crime, uma e outra vez?

O Papa Francisco, em 2019, proclama o sigilo sacramental como indispensável, admitindo ainda que nenhum poder humano tem jurisdição “(…) nem pode reivindicá-la, sobre ele.”. É verdade que o Vaticano adotou a Lei N. CCXCVII sobre a Proteção dos Menores e Pessoas Vulneráveis, segundo a qual deve ser apresentada a denúncia sem demoras quando se tome conhecimento de crimes de abuso cometidos contra menores, reforçando o combate a estas formas de violência; no entanto, é de referir que o sigilo sacramental fica salvaguardado. Ou seja, se se tomar conhecimento de ofensas contra menores, em confissão, o sigilo prevalecerá.

Não podendo a absolvição estar vinculada a uma denúncia do crime à polícia, de acordo com o Direito Canónico, deve o confessor, no entanto, convencer o perpetrador a assumir responsabilidade pelas suas ações, nomeadamente entregando-se à justiça.

Ora, tratando-se de um flagelo social que não vê qualquer travão e é cada vez mais trazido à luz do dia, será suficiente, perante uma confissão daquelas, um mero conselho ou uma mera instigação a que se faça o correto?

O artigo 135.º do Código de Processo Penal dispõe que os médicos, jornalistas, ministros de confissão religiosa e demais pessoas, a quem a lei permitir ou impuser segredo, podem escusar-se a depor sobre os factos. Não obstante, o número 3 do preceito referido dá conta da possibilidade de quebra de segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, se o depoimento for imprescindível para a descoberta do crime, se existir necessidade de proteção de bens jurídicos ou se a gravidade do crime justificar essa quebra.

Também o advogado está obrigado ao segredo profissional, ao abrigo do disposto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados. No entanto, também é verdade que o n.º 4 daquele artigo dita que se possam revelar factos abrangidos pelo segredo profissional se tal for absolutamente necessário, mediante prévia autorização do presidente do conselho regional respetivo. O que, aliás, coincide com o papel do advogado de colaborar com a justiça, de ser o garante dos direitos e liberdades dos cidadãos.

É certo que o papel do confessor assume um caráter espiritual, ao contrário do papel do advogado, mas não faria sentido que o sigilo da confissão tivesse regime semelhante?

Não obstante, vigora em Portugal a Concordata entre a República Portuguesa e a Santa Sé desde 2004, que é soberana nesta matéria: o seu artigo 5.º dita que os eclesiásticos não podem ser perguntados sobre factos e coisas de que tenham tido conhecimento por motivo do seu ministério.

Apesar de a Igreja estar separada do Estado e ser livre na sua organização, percebe-se que o direito à integridade pessoal, bem como o direito à infância, consagrados na nossa Constituição deveriam ser mais acautelados pela própria Igreja, conciliando o direito ao sigilo sacramental com as situações limite em que não é possível ou tolerável sequer manter esse segredo, face ao crescimento do número de casos de abuso sexual contra menores no seio da Igreja, sendo que muitos não chegam sequer a ser conhecidos, muitas vezes porque o crime é encoberto pelos pares.

O ideal era, pois, que a Igreja revisse as suas orientações, nomeadamente quanto ao sigilo da confissão; no entanto, sabendo que a lei geral não derroga a lei especial, e consequentemente não se aplica o Código de Processo Penal, ainda há um longo caminho a percorrer.

Filipa Silva

Andreia Teixeira de Sousa

 

*Atualizado a 07-11-2022

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Sofreu um acidente de viação? Conheça os prazos legais a cumprir

Sofreu um acidente de viação? Conheça os prazos legais a cumprir

O incumprimento dos prazos pode ter consequências em matéria de direitos e deveres, tanto para quem sofre o acidente como para as seguradoras. Fique atento aos principais prazos a cumprir e saiba quanto tempo tem de esperar pela regularização do sinistro.

 

Prazos legais a cumprir pelo sinistrado/lesado

  • Participação do sinistro à seguradora: nunca superior a 8 dias, a contar da data da ocorrência, sob pena de responder por perdas e danos.
  • Apresentação de queixa-crime: 6 meses a contar da data do acidente. Poderá ser fundamental para garantir a condenação da seguradora ou outros responsáveis ao pagamento da indemnização.
  • Ação cível: 3 anos a contar da data do evento lesivo; se o facto ilícito que deu origem ao acidente constituir crime (ofensas à integridade física graves ou morte), o prazo poderá ser alargado até 5 a 10 anos.

O não cumprimento destes prazos acarreta a perda do direito à indemnização por parte do lesado.

 

Prazos legais a cumprir pela seguradora

  • Após o conhecimento de um sinistro, a seguradora tem 2 dias úteis para realizar o primeiro contacto com o sinistrado indicado na participação, e marcar as diligências necessárias para apurar responsabilidades, como as peritagens.
  • Peritagens:

– As peritagens devem ser realizadas 8 dias úteis depois do prazo mencionado na alínea anterior, e sendo necessária desmontagem, a sua conclusão deverá ocorrer no prazo máximo de 12 dias úteis depois do primeiro contacto com o sinistrado.

o Se a seguradora não detiver a direcção efectiva da reparação e indicar uma oficina diferente, este prazo contar-se-á a partir do momento em que existe disponibilidade da oficina e autorização do proprietário do veículo.

– Os relatórios das peritagens deverão ser disponibilizados ao lesado 4 dias úteis após a sua conclusão.

– A seguradora deve informar o sinistrado se pretende fazer o exame de avaliação do dano corporal:

o No prazo de 20 dias, se existir pedido de indemnização;

o Não existindo pedido de indemnização, 60 dias após a data da comunicação do acidente.

o O exame deve ser disponibilizado ao lesado 10 dias a contar da data em que a seguradora o tenha em seu poder.

  • A seguradora deve comunicar ao segurado e ao terceiro lesado a assunção ou a não assunção da responsabilidade no prazo máximo de:

 

o 30 dias úteis a contar do último dia do prazo para o primeiro contacto, se houver apenas danos materiais (15 dias se existir uma declaração amigável de acidente automóvel);

o 45 dias a contar da data em que é feito o pedido de indemnização, se houver danos corporais que tenham sido totalmente quantificados após emissão de boletim de alta clínica.

-> Estes prazos podem ser alargados se o acidente tiver ocorrido sob condições climatéricas excepcionais, ou aquando da ocorrência de um choque em cadeia que envolva muitos acidentes em simultâneo, ou suspensos se existir suspeita fundamentada de fraude.

  • Apresentação de proposta provisória: se o sinistrado ainda se encontrar de baixa e o dano não for totalmente quantificável passados os 45 dias após o pedido de indemnização, a empresa de seguros deve apresentar uma proposta provisória.
  • O pagamento da indemnização, salvo acordo em contrário, deve ser disponibilizado pela seguradora 8 dias úteis a contar da data da assunção da responsabilidade.

o Se a seguradora não proceder ao pagamento no prazo fixado, deverá pagar ao lesado juros de mora, no dobro da taxa legal, sobre o montante devido e não pago.

Os valores propostos pela seguradora não prejudicam a análise por quem dispõe de experiência e conhecimentos técnicos na matéria.

 

Quais as consequências do não cumprimento de prazos?

Para os lesados, o não cumprimento ou a prescrição dos prazos pode acarretar a perda definitiva do direito à indemnização, pelo que é da maior importância o aconselhamento especializado em como proceder e em que tempo, de forma a assegurar uma efectiva protecção dos direitos.

Apesar de recair sobre as seguradoras a obrigação legal de contactar o sinistrado/lesado para a indemnização, é a este último que incumbe o dever de reclamar a indemnização que lhe é devida, sob pena de perder o direito à mesma.

Já para a seguradora, a infração dos prazos supramencionados constitui contra-ordenação punível com coima.

 

Prazos para acidentes de viação no estrangeiro

Se o sinistro ocorrer no estrangeiro, mas for aplicável a lei portuguesa, os prazos a cumprir são determinados por esta última. Neste caso, justificadamente, pode ocorrer um alargamento dos prazos.

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Pensar A Direito | “O que estão a fazer ao meu papá?”

Pensar A Direito | "O que estão a fazer ao meu papá?"

Todos nós, adultos, tivemos – ou deveríamos ter tido – o direito a ser crianças.

Ser criança é um direito, consagrado na Convenção sobre os Direitos da Criança.

Ser criança no mundo dos adultos, no entanto, pode ser uma experiência traumática e negativamente transformadora.

Já todos conhecemos cenas de filme de forças policiais que arrombam a porta a meio da noite, correm a casa com voz autoritária, desarrumam tudo violentamente com armas na mão e detêm os criminosos. Mas… e se nessa casa estiver uma criança?

E, numa “operação stop”, se os condutores forem detidos e, nesse carro, seguir uma criança?

A quem se entrega a criança?

Quem avalia e toma essa decisão?

Como se processa essa entrega?

E se não existir ninguém idóneo para ficar com a criança?

Estarão as forças policiais capazes de decidir e conduzir (mais) este procedimento?

Quem tem sensibilidade para tomar conta de (mais) esta ocorrência?

E se o objecto da busca domiciliária estiver escondido no corpo da própria criança?

Quem, e como, faz a revista à criança?

E se uma mãe com filhos menores cometer um crime punível com pena de prisão? Deverá o impacto da prisão para os menores ser ponderado na pena aplicada?

Estão previstos direitos específicos, designadamente o direito de contacto e visita para os menores com pais reclusos?

Interessa, pois, saber como se garante o superior interesse da criança, sem prejudicar a recolha e a preservação dos meios de prova e o cumprimento de regras processuais.

O que deve prevalecer? A criança ou o processo? Há forma de conciliar estes interesses?

Pois… os adultos também têm dúvidas e, algumas vezes, não sabem as respostas.

Resta procurá-las, questionando.

É verdade que não pode forjar-se ou ignorar-se a realidade da criança, mas a criança tem direito a que a realidade lhe seja explicada de forma a que ela a possa entender e processar, para que esta realidade não resulte, para si, numa fatalidade. É este também o papel do Estado de Direito.

A convite do nosso parceiro, CASPAE, participamos actualmente num grupo de trabalho que conjuga várias perspectivas de forma muito aprofundada – reflexão que, por motivante, nos absorve.

Estamos certos de que, nesta área, como noutras do Direito, o caminho é este: o de conhecer, problematizar, discutir e, no final, propor e mudar.

Antes disso, no entanto – num caminho que se adivinha mais tortuoso do que se queria – é fundamental que todos os intervenientes processuais se vão sensibilizando para este tema. Os Juízes, os Magistrados do Ministério Público, os Advogados, os órgãos de polícia criminal, os funcionários judiciais; porque todos podem ter um papel transformador.

Como Advogada admito que muito mais poderia ser feito pela nossa Classe, considerando que somos um interveniente com grande proximidade aos arguidos e, por isso, com a possibilidade de sermos diferenciadores na garantia dos direitos das crianças.

 

Daniela Sequeira

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Coeficiente de atualização de rendas para 2023

Coeficiente de atualização de rendas para 2023

A Lei n.º 19/2022, de 21 de outubro, determina o coeficiente de atualização de rendas para 2023; cria um apoio extraordinário ao arrendamento; reduz o IVA no fornecimento de eletricidade; estabelece um regime transitório de atualização das pensões; estabelece um regime de resgate de planos de poupança e determina ainda a impenhorabilidade de apoios às famílias.

No que ao arrendamento diz respeito, durante o próximo ano civil (2023) não se aplica o coeficiente de atualização anual de renda que se previa desde 2006, ficando este coeficiente fixo no valor de 1,02, sendo que podem as partes decidir e estipular de forma diferente.

Contudo, a proteção não se estende apenas aos arrendatários, mas também aos senhorios: visa-se compensar estes pela limitação imposta ao aumento das rendas. O que se pretende é que o imposto que cabe aos senhorios pagar em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoais Singulares (IRS) e em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) seja reduzido de tal forma que seja possível cobrir a diferença entre os 2% e o valor que as rendas efetivamente subiriam se fossa aplicado o coeficiente anual que se fixaria com base na taxa de inflação.

Quanto ao Imposto que incide sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, a determinação dos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento obter-se-á através da aplicação do coeficiente 0,91 após as deduções previstas no artigo 41º CIRS.

Para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), a determinação dos rendimentos tributáveis de rendas obtém-se através da aplicação do coeficiente de 0,87.

Estes coeficientes de apoio legalmente previstos aplicam-se a rendas que reúnam estas três condições cumulativamente:

1. Se tornem devidas e sejam pagas em 2023;

2. Surjam de contratos de arrendamento que vigorassem antes de 1 de janeiro de 2022 e que tenham sido efetivamente comunicados à Autoridade Tributária e Aduaneira;

3. Não se trate de contratos que sejam objeto de atualização a um valor superior ao que resulte da aplicação do coeficiente de atualização, ou seja, 2%.

 

O disposto neste “Fique Atento” vigorará, nos termos do artigo 10º da Lei nº19/2022, apenas entre 1 de janeiro de 2023 e 31 de dezembro de 2023.

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Pensar A Direito | A vítima

Pensar A Direito | A vítima

A Vítima, por força da Convenção de Istambul, é Sujeito Processual do Processo Penal. Como também é o Tribunal (Juiz), o MP, o Arguido, o Assistente e o Defensor (Advogado).

Por via da Lei 130/2015, de 4 de setembro, 1) foi transposta para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva 2012/29/EU do Parlamento e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, que estabelece normas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade, 2) aprovou-se o Estatuto da Vítima e 3) procedeu-se à alteração do Código do Processo Penal (CPP), nomeadamente com o aditamento do artigo 67.º-A.

A introdução deste artigo, com a epígrafe Vítima, criou também um novo título no Livro I da Parte I, com o mesmo nome, Vítima.

É Vítima, a pessoa singular que sofreu um dano, nomeadamente um atentado à sua integridade física ou psíquica, um dano emocional ou moral, ou um dano patrimonial, diretamente causado por ação ou omissão, no âmbito da prática de um crime e os familiares de uma pessoa cuja morte tenha sido diretamente causada por um crime e que tenha sofrido um dano em consequência dessa morte, como é dito na alínea a) do n.º1) e na alínea c) do n.º 2.

Por sua vez, ofendido, diz o artigo 68.º, n.º 1, al. a), é o titular do interesse que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maior de 16 anos. Este, para ser sujeito processual, tem de se constituir Assistente.

O Assistente é aquele que se considera ofendido com o ilícito penal cometido, sendo o titular dos interesses que a lei quis proteger com a incriminação, artigo 68.º n.º 1 a). A pessoa que reúna essa qualidade, querendo beneficiar do estatuto processual de Assistente, requer a sua constituição como tal no processo e, para o efeito, tem de constituir Advogado.

O artigo 68.º do CPP legitima, assim, que o ofendido seja sujeito processual. O Assistente tem o estatuto de colaborador do MP, devendo-lhe subordinação. Pode requerer e oferecer provas, contribuir para a solução a dar ao caso em concreto, deduzir acusação independente do MP, artigo 283.º e 284.º sendo que pelos mesmos factos da acusação deduzida pelo MP, no caso de crime particular a competência para a dedução de acusação é do Assistente, por força do artigo 285.º do CPP, pode requerer a abertura de instrução e pode ainda recorrer das decisões que o afetem.

Assim sendo, se é Assistente aquele que se considera ofendido com o ilícito penal cometido, e se é Vítima a pessoa singular que sofreu um dano diretamente causado por ação ou omissão, no âmbito da prática de um crime, pelo menos, para as pessoas singulares, não se revela útil fazer a distinção entre estes 2 sujeitos.

Mais, o conceito de Vítima é muito mais amplo do que o de ofendido, como se vê pelo artigo 67.º-A, nº 4, em que assistem às vítimas os direitos de informação, de assistência, de proteção e de participação ativa no Processo Penal, previsto no código do Processo Penal e no Estatuto da Vítima e, o n.º 5, que diz que a vítima tem o direito a colaborar com as autoridades policiais ou judiciárias competentes, prestando informações e facultando provas que se revelem necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, ambos do artigo 67.º-A. Mais amplo é, no que concerne à idade da vítima.

Coloca-se a questão: sendo o ofendido Vítima, porque o conceito amplo de Vítima absorve o de ofendido, porque é que a Vítima necessita de se constituir Assistente para ser sujeito processual, se o artigo 67.º-A já diz que é sujeito processual? Não deveria este artigo referir que a Vítima adquire automaticamente o estatuto de Assistente?

Por outro lado, parece que a Vítima ainda não adquiriu o Estatuto enquanto sujeito processual. Veja-se o exemplo do artigo 281-º do CPP, quanto à Suspensão Provisória do Processo, em que não é referida a vítima. Esqueceu-se o legislador?

O mesmo sucede no artigo 401.º do CPP, já no âmbito dos recursos ordinários, com a epígrafe Legitimidade e interesse em agir, também parece ter-se o legislador esquecido de inserir aqui a vítima. Não tem a vítima legitimidade e interesse em agir por força do artigo 67.º-A enquanto sujeito processual? Embora, diga-se, que fazendo uma interpretação a contrario do n.º 2 deste artigo, a vítima terá interesse em agir e como tal poderá recorrer mesmo não se tendo constituído assistente (sublinhado nosso).

Será urgente que o legislador, nesta matéria, faça uma análise aturada e apurada, por forma clarificar a Vítima enquanto Sujeito Processual e, mais importante, ajudar na implementação de Politicas Públicas, que vão para além da sensibilização para a prevenção de crimes graves como o da violência doméstica.

 

Carlos Antunes Pina

Manuel Castelo-Branco

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Vistos para nómadas digitais

Vistos para nómadas digitais

Com as novas alterações à Lei dos Estrangeiros (Lei n.º23/2007, de 4 de julho), a partir de 30 de outubro os trabalhadores subordinados ou profissionais independentes passam a poder pedir um visto de residência ou de estada temporária para o exercício de atividade profissional prestada de forma remota a partir de Portugal, mantendo o vínculo laboral com um empregador com domicílio ou sede fora do país.

Criam-se assim dois novos regimes de vistos, desenhados especificamente para os “Nómadas Digitais”, trabalhadores que pela natureza da sua profissão, com horários e locais de trabalho mais flexíveis, se permitem desempenhar as suas funções em qualquer parte do Mundo.

O visto de residência destina-se especificamente a permitir ao seu titular a entrada em território português, por duas vezes, a fim de solicitar uma autorização de residência, habilitando-o a permanecer no país por um período de quatro meses.

Já o visto de estada temporária permite múltiplas entradas e a estada em território nacional por período inferior a um ano, sendo concedido pelo tempo da duração da permanência do titular do visto em Portugal.

Sendo necessário que a entidade empregadora seja uma pessoa singular ou colectiva com domicílio ou sede fora do território nacional, nas situações de trabalho subordinado, o pedido de visto pode fazer-se acompanhar de contrato de trabalho ou declaração de empregador a comprovar o vínculo laboral.

Já aquando de exercício de atividade independente, é necessário apresentar um contrato de sociedade, um contrato de prestação de serviços ou um documento demonstrativo de serviços prestados a uma ou mais entidades.

Uma outra diferença entre o visto de residência e o visto de estada temporária é que este último permite ainda que seja apresentada uma promessa de contrato de trabalho ou uma proposta escrita de contrato de prestação de serviços.

É de salientar que ambos os pedidos necessitam de ser acompanhados de um documento que ateste a sua residência fiscal, bem como o comprovativo de rendimentos médios mensais auferidos no exercício de atividade profissional subordinada ou independente nos últimos três meses de valor mínimo equivalente a quatro remunerações mínimas mensais garantidas, ou seja, é necessário que o trabalhador aufira uma remuneração de 2820 euros.

 

 

A presente nota informativa não dispensa a consulta dos diplomas em apreço.

A FAF Advogados permanecerá atenta às actualizações relativas a esta matéria, dando delas, a todos os seus clientes e parceiros, a devida e oportuna nota.

 

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É necessário reflectir (séria e verdadeiramente)…

É necessário reflectir (séria e verdadeiramente)…

Face ao crescendo número de casos – demasiados – o crime de violência doméstica passou a, no ano 2000, ter natureza pública. O que vem de significar que o procedimento criminal não está dependente da apresentação de uma queixa, formal ou informal, por parte da vítima, sendo apenas necessário haver uma denúncia ou o conhecimento do crime, para que o Ministério Público promova o processo.

O crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º do Código Penal é punível com pena de prisão de 1 a 5 anos ou, nos casos mais graves, dos quais resulte ofensa à integridade física grave da vítima ou morte, de 2 a 8 anos ou 3 a 10 anos, respectivamente.

No ano 2021, a violência doméstica foi o crime mais participado (26.520 registos de participações). A 31.12.2021, encontravam-se registadas 810 condenações e 243 reclusos preventivos (208 dos quais a aguardar julgamento e 35 a aguardar trânsito em julgado de decisão proferida). 74,9 % das vítimas, são mulheres.

Já este ano, em 03.01.2022, Elsa Luz foi morta pelo marido, baleada na cabeça (Beja).

Em 27.01.2022, Aida Guterres foi morta pelo marido, a tiro de caçadeira (Vendas de Azeitão) .

Em 25.02.2022, Sandra Rocha foi morta pelo marido, estrangulada (Rio de Moinhos).

Em 28.02.2022, Silvana Moraes foi morta pelo marido, baleada (Murches).

Em 11.03.2022, Lucília Brandão foi morta pelo ex-companheiro, estrangulada e esfaqueada (Arcos de Valdevez).

Em 13.03.2022, Maria Luísa, portadora de Alzheimer, foi morta pelo marido, estrangulada (Lagos).

Em 20.03.2022, Madalena Macieirinha foi morta pelo marido, asfixiada (Tainha).

Em 08.04.2022, Marta Carvalho foi morta pelo marido, baleada na cabeça e no pescoço (Barcelos).

Em 03.05.2022, Sónia Barros foi morta pelo marido, baleada (Correlhã).

Em 04.06.2022, Celestina Barros foi morta pelo ex-companheiro, baleada (Escariz).

Em 06.06.2022, Sílvia Mendes foi morta pelo marido, baleada (Refontoura).

Em 15.06.2022, Assunção Correia foi morta pelo neto, à pancada (São Martinho).

Em 21.06.2022, Sara Barros foi morta pelo marido, baleada (Zambujal).

Em 21.06.2022, Cláudia Serra foi morta pelo ex-companheiro, atacada com um ferro e baleada (Soalhães).

Em 26.06.2022, Maria Borges foi morta pelo marido, estrangulada (Abóboda).

Em 15.07.2022, Vânia Coelho foi morta pelo marido, à facada (Rio de Mouros).

Em 19.09.2022, uma mulher foi morta pelo companheiro, degolada (Odivelas).

Em 05.10.2022, uma mulher foi morta pelo ex-companheiro, à facada e em frente aos filhos menores (Oeiras).

Estas mulheres – como milhares de outras antes delas – não chegaram a ver a Justiça a ser feita.

Muitas destas mulheres estavam já sinalizadas como vítimas de violência doméstica.

Com doentia resignação, continua a assistir-se às mortes de mulheres, às mãos dos companheiros ou ex-companheiros.

A necessidade (real) de criação de medidas de protecção eficazes das vítimas dos crimes de violência doméstica e a necessidade (real) de punição severa dos infractores é apanágio e adágio na ponta da língua de muitos.

Mas, cartazinhos colados nos postos da PSP ou GNR anunciando que a violência doméstica é crime, sem uma verdadeira sensibilização, é pura demagogia.

Mas, discursozinhos, em tempo de eleições, a pedir o reforço da protecção das vítimas de crimes de violência doméstica, sem uma verdadeira sensibilização, é pura demagogia.

A aplicação de penas pesadas sem, antes, terem sido aplicadas medidas adequadas de protecção à vítima e capazes de as defender, é pura demagogia.

Com efeito, muitas foram as alterações legislativas no sentido de reforçar a punição dos agentes. Todavia, esta abordagem punitiva, apesar de inelutavelmente importante, não tem sido dissuasora. Além do mais, vem apenas de significar que o Estado não está a ser capaz de agir antes do cometimento do crime. Limita-se a reagir. E não se ignora a importância desta reacção. Mas a vida de todas aquelas vítimas que perecem às mãos dos agressores é ainda mais importante. É preciso que os senhores magistrados sejam sensibilizados, melhor, sejam educados no sentido da protecção da vítima e não na desculpabilização do infractor.

É, por fim e de uma vez por todas, necessário reflectir, séria e verdadeiramente, as razões sociológicas (culturais, económicas, religiosas, sentimentais) que estão por trás do cometimento destes crimes e combatê-las, com tolerância zero.

 

Andreia Teixeira de Sous

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Medidas de apoio às empresas em face do aumento dos preços da energia

Medidas de apoio às empresas em face do aumento dos preços da energia

 

Resolução do Conselho de Ministros n.º 87/2022, de 4 de outubro

Esta Resolução vem no seguimento da Comunicação da Comissão Europeia 2022/C 280/01, de julho de 2022, que alterou o “Quadro temporário de crise relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia na sequência da agressão da Ucrânia pela Rússia” e estabelece um conjunto de apoios às empresas em face do aumento dos preços da energia resultante do contexto geopolítico.

 

  1. Alterações ao Programa “Apoiar as Indústrias Intensivas em Gás” (sujeitas a aprovação da Comissão Europeia):

i. Aumento da dotação afeta ao sistema de incentivos até ao montante de 220 000 000 euros, financiada por verbas com origem em reembolsos de beneficiários de fundos europeus;

ii. O limite máximo de apoio atribuível por empresa passa de 400 000,00 euros para 500 000,00 euros, a aplicar retroativamente às candidaturas anteriormente submetidas;

iii.  Dá-se um aumento da taxa de apoio sobre o custo elegível de 30 para 40%, a aplicar retroativamente às candidaturas anteriormente submetidas;

iv. Criam-se duas modalidades de apoio, cumulativas com o apoio previsto no ponto ii.:

  • a primeira, que prevê a atribuição de um auxílio por empresa de até 2 000 000,00 euros, dirigida às empresas com aumentos excecionais e particularmente elevados nos custos de aquisição de gás natural;
  • a segunda dirigida à continuação da actividade económica que permita a atribuição de um auxílio por empresa até 5 000 000,00 euros, quando demonstradas perdas de exploração.

v. Alarga-se o sistema de incentivos às empresas da indústria transformadora agroalimentar, com uma dotação de 15 000 000,00 euros.

 

  1. Lançamento de uma nova linha de crédito

Esta linha de crédito, com garantia mútua, dirige-se a empresas especialmente afetadas pelo aumento acentuado dos custos energéticos e das matérias-primas, assim como pelas perturbações das cadeias de abastecimento. Entra em vigor até ao dia 4 de novembro do presente ano, a promover pelo Banco Português de Fomento, com prazo de até 8 anos, com 12 meses de carência de capital e no montante global de até 600 000 000,00 euros.

 

  1. Adoção de medidas de eficiência e de aceleração da transição energética

É estipulada a adoção de medidas de eficiência e de aceleração da transição energética, a determinar através de aviso para abertura de candidaturas, dirigidas à redução do consumo de energia e à implementação de sistemas que permitam gerir e melhorar os consumos de energia, com base na computação e na automação:

i. A promover pelo IAPMEI Agência para a Competitividade e Inovação, I. P., no domínio industrial, no âmbito da componente C11 do plano de recuperação e resiliência, com dotação de 250 000 000,00 euros;

ii. No domínio agrícola, no âmbito do programa de desenvolvimento rural 2020 (PDR2020), com dotação de 40 000 000,00 euros.

 

  1. Medidas de apoio ao emprego ativo e desenvolvimento de estratégias de atuação empresarial em contexto de produção

É estabelecida a adoção de medidas de apoio ao emprego ativo e desenvolvimento de estratégias de atuação empresarial em contexto de produção, orientadas para a manutenção da atividade empresarial e do emprego que permitam a otimização dos tempos de produção através de formação qualificada de trabalhadores durante o processo produtivo.

São medidas, a promover, com efeitos imediatos, pela autoridade de gestão do programa operacional temático competitividade e internacionalização e serão determinadas através de aviso para abertura de candidaturas.

Esta medida é financiada por fundos europeus e tem uma dotação de 100 000 000,00 euros.

 

  1. Reforçar a presença internacional das empresas

Estipula-se a adoção de medidas para reforçar a presença internacional das empresas, o acesso a novos mercados e a promoção externa, nomeadamente nos mercados externos à União Europeia.

A determinação de tais medidas consta de avisos de candidaturas publicados até 30 de setembro de 2022, promovidos pela autoridade de gestão do programa operacional temático competitividade e internacionalização, conjuntamente com a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, E. P. E..

Esta medida tem uma dotação de (euro) 30 000 000,00, financiada por fundos europeus.

 

  1. Apoio financeiro extraordinário para o setor do transporte ferroviário de mercadorias

É criado um apoio financeiro extraordinário com vista à mitigação dos efeitos de escalada de preços dos combustíveis e da eletricidade no setor do transporte ferroviário de mercadorias, a atribuir pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P., dirigido aos operadores de transporte ferroviário devidamente licenciados para a prestação de serviços de transporte de mercadorias na rede ferroviária nacional.

Este apoio tem uma dotação de 15 000 000,00 euros.

O apoio é atribuído mediante subvenção direta aos operadores do transporte ferroviário de mercadorias, a ser pago durante o ano de 2022, e considerando uma subvenção por locomotiva e por km percorrido.

 

  1. Regime excecional e temporário no âmbito do aumento dos preços com impacto em contratos públicos

A vigência do Decreto-Lei n.º 36/2022, de 20 de maio, que estabelece um regime excecional e temporário no âmbito do aumento dos preços com impacto em contratos públicos é estendida até ao dia 30 de junho de 2023.

Determina-se ainda a aplicação do regime aos pedidos de revisão extraordinária de preços por empreiteiros de obras públicas apresentados até à mesma data.

 

  1. Medidas de apoio ao setor social

i. Linha de financiamento ao setor social:

Estabelece-se o lançamento de uma nova linha de financiamento ao setor social, dirigida a entidades que desenvolvem respostas sociais. É concedido até 31 de dezembro de 2023 e a linha tem um montante máximo de 120 000 000,00 euros.

ii. Comparticipação financeira pelo aumento do preço do gás:

É atribuída uma comparticipação financeira pelo aumento do preço do gás, tendo por referência a diferença de preços entre o ano anterior e o ano corrente, às instituições particulares de solidariedade social ou entidades equiparadas sem fins lucrativos, que desenvolvam respostas sociais de carácter residencial.

 

  1. Criação do programa Trabalhos & Competências Verdes/Green Skills & Jobs

O programa, a implementar pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I. P., tem como objetivo prevenir o desemprego, promover a manutenção dos postos de trabalho e estimular a criação de emprego no âmbito da aceleração da transição e eficiência energética e destina-se a:

  • Formação e requalificação dos trabalhadores das empresas direta ou indiretamente afetadas pelo aumento dos custos de energia;
  • Formação e requalificação de desempregados.

O programa tem uma dotação de 20 000 000,00 euros.

 

  1. Produtos petrolíferos e energéticos

Suspendem-se, até 31 de dezembro de 2022, os efeitos da disposição transitória do Imposto Sobre os produtos Petrolíferos e energéticos (ISP) prevista no Orçamento de Estado de 2022, quanto ao gás natural utilizado na produção de eletricidade e cogeração.

É ainda prorrogada até ao final do corrente ano a redução temporária da taxa unitária do ISP aplicável ao gasóleo colorido e marcado aplicável no continente.

 

  1. Mecanismo de gasóleo profissional extraordinário

Prorroga-se a vigência do mecanismo referido, para os estabelecimentos elegíveis (empresas de transporte de mercadorias por conta de outrem, com sede ou estabelecimento estável num Estado-Membro) que ocorram até 31 de dezembro de 2022.

 

  1. Imposto sobre o Rendimento das pessoas Coletivas (IRC):

A Resolução propõe ainda, para o ano de 2022:

– Majoração em 20%, para efeitos de IRC, dos gastos com eletricidade e gás natural;

– Majoração em 20%, para efeitos de IRC, dos gastos com fertilizantes, rações e demais alimentação animal, quando usados para atividades de produção agrícola.

 

A Resolução entrou em vigor no dia 5 de outubro.

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Coimbra | Telefone: +351 239 822 204
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Regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional

Regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional

Entrou em vigor no passado dia 26 de agosto a Lei n.º 18/2022, de 25 de agosto, que altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (vulgarmente conhecido como “Lei dos Estrangeiros”), e cria condições para a implementação do Acordo de Mobilidade entre os Estados membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (assinado em 17 de julho de 2021).

Entre as alterações mais relevantes, e para além da substituição dos termos “Comunidade Europeia”, “Sistema de Informação Schengen” e “ACIDI, I.P.” por, respetivamente, “União Europeia”, “SIS” e “ACM, I.P.”, destacamos:

 

I. Vistos de entrada

 

  1. Entrada no País sem visto de entrada: com a alteração, passam a poder entrar em território nacional, sem visto, os cidadãos estrangeiros que beneficiem dessa faculdade nos termos dos regimes especiais constantes de:
  • Acordos bilaterais ou multilaterais celebrados entre a União Europeia (UE) ou a UE e os seus Estados membros, por um lado, e um ou mais Estados terceiros por outro;
  • Convenções internacionais de que Portugal seja parte ou a que se vincule, em especial os celebrados ou que venha a celebrar com países de língua oficial portuguesa, a nível bilateral ou no quadro da Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa;
  • Acordos de mobilidade celebrados entre Portugal e Estados terceiros;
  • Protocolos e memorandos de entendimento celebrados entre Portugal e Estados terceiros.

 

  1. Visto para “procura de trabalho”

É concedido por um período de 120 dias, prorrogável por mais 60 dias, e habilita o seu titular a entrar e permanecer em território nacional com a finalidade de procura de trabalho, desde que cumpridos os seguintes requisitos:

  • Não tenha sido sujeito a medida de afastamento e se encontre no período subsequente de interdição de entrada e de permanência em território nacional;
  • Não esteja indiciado, para efeitos de regresso, acompanhado de uma proibição de entrada e de permanência no SIS por qualquer Estado membro da União Europeia ou onde vigore a Convenção de Aplicação;
  • Não esteja indicado, para efeitos de recusa de entrada e de permanência no Sistema Integrado de Informação do SEF, ou para efeitos de regresso;
  • Disponha de meios de subsistência;
  • Disponha de documento de viagem válido;
  • Disponha de seguro de viagem;
  • Disponha de autorização parental ou documento equivalente, quando o requerente for menor de idade e durante o período de estada não esteja acompanhado por quem exerce as responsabilidades parentais ou responsabilidades no âmbito do maior acompanhado;
  • Disponha de título de transporte que assegure o seu regresso.

Se o titular do visto, dentro do período de duração máxima da validade do visto constitua e formalize relação laboral, pode este requerer uma autorização de residência, desde que preencha as condições gerais de concessão de autorização temporária de residência.

Findo o limite máximo de validade do visto e sem que o seu titular tenha constituído uma relação laboral e iniciado o processo de regularização documentar, terá este de abandonar o país, só podendo instruir novo de pedido de visto para o mesmo fim um ano após expirar a validade do visto anterior.

 

  1. Visto de residência para exercício de actividade profissional subordinada

Passa a poder ser emitido visto de residência para o exercício de actividade profissional subordinada a nacionais de Estados terceiros que cumpram as condições gerais de vistos de residência, de estada temporária e de curta duração e que possuam contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho, ou possuam habilitações, competências ou qualificações reconhecidas e adequadas para uma das ofertas de emprego constantes do sistema de informação permanente do Instituto de Emprego e da Formação Profissional, I. P., e dos respectivos serviços competentes de cada região autónoma, e que beneficiem de uma manifestação de interesse individualizada de interesse da entidade empregadora.

 

  1. Visto de residência para o exercício de actividade profissional prestada de forma remota para fora do território nacional

É atribuído a trabalhadores subordinados e profissionais independentes para o exercício de actividade profissional prestada, de forma remota, a pessoas singulares ou colectivas com domicílio ou sede fora do território nacional.

É também prevista a atribuição de visto de estada temporária, por um período inferior a um ano, para exercício de actividade profissional subordinada ou independente, prestada, de forma remota, a pessoa singular ou colectiva com domicílio ou sede fora do território nacional.

 

 

II. Título de viagem para refugiados

O título passa a ser válido pelo período de 5 anos, sujeito a renovações. Este passa a permitir ao seu titular a entrada e saída do território nacional, bem como do território de outros Estados que o reconheçam para esse efeito.

São aplicáveis as regras previstas para o passaporte eletrónico português quanto às condições de validade, características e controlo de autenticidade do título de viagem para refugiados.

 

Email: [email protected]
Coimbra | Telefone: +351 239 822 204
Lisboa | Telefone: +351 213 224 930
Porto | Telefone:  +351 223 262 795

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O Caos nas Maternidades

O Caos nas Maternidades

De norte a sul do País, os últimos meses têm sido marcados por constrangimentos nas urgências de ginecologia e obstetrícia e nos blocos de partos. A falta de profissionais de saúde e a consequente dificuldade de organização das escalas de serviço tem levado a encerramentos de maternidades um pouco por todo o País, pondo em causa um acompanhamento adequado e próximo às grávidas.

Tal circunstância levou mesmo a que o Portal do Serviço Nacional de Saúde passasse a contar com informação diária sobre os horários de funcionamento dos serviços de urgência obstétrica/ginecológica e blocos de partos, por forma a que as grávidas possam verificar a maternidade a que se poderão dirigir, antes de sair de casa. Uma realidade que condiciona as grávidas, obrigando-as a ponderar todas as deslocações (sobretudo em período de férias) em conformidade com as unidades de saúde que garantam o seu bem-estar e o bem-estar do bebé.

Ora, de acordo com a Constituição da República Portuguesa constitui tarefa fundamental do Estado “promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efetivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais”.

De facto, o direito à proteção da saúde, enquanto direito social típico, reclama uma atuação positiva por parte do Estado com vista à prevenção e ao tratamento das doenças, a quem incumbe prioritariamente “garantir uma racional e eficiente cobertura de todo o país em recursos humanos e unidades de saúde”.

Incumbe, pois, ao Estado Português zelar pela coesão nacional, garantindo a proteção de saúde individual de cada grávida, independentemente do local da sua residência, através da instalação de serviços de urgência de ginecologia-obstetrícia nos vários pontos do País ou, alternativamente, através da garantia de uma rede de transportes inter-hospitalar (dotado de todos os mecanismos de segurança para a grávida e para o bebé) que consiga colmatar a distância entre o local de residência da grávida e a maternidade mais próxima que se encontre em funcionamento.

A violação destas disposições e princípios constitucionais poderá vir a justificar a responsabilização do Estado, em conformidade com a Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro.

Marta Frias Borges

Email: [email protected]
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